De Ponte de Lima a Santiago de Compostela – 1ª e 2ª Etapas
8 a 13 Abril 2010
Preparação -pressupostos iniciais.
Organizar e preparar uma viagem deste tipo, de acordo com os meus princípios e “filosofia” de viagem, isto é, máximo de autonomia e o menos “pesado!” possível, não foi tarefa fácil.
Fiz,… e desfiz, o saco vezes sem conta. Comecei por uma mochila de 25 Lts. Conseguia transportar tudo mas, o facto de ter que colocar o saco-cama e a esteira fora da mochila, fizeram-me equacionar a situação de chuva e mau tempo, acabando por achar pouco prática esta configuração. A cobertura da mochila não se adaptava, e um saco cama molhado, de nada serve e constitui um peso morto que nos faz rogar pragas ao diabo!
Passei a uma mochila de 30 Lts. Tudo bem. Consegui colocar todo o material (depois de criteriosamente seleccionado, vezes sem conta, como disse) mas o acesso a qualquer coisa que fosse preciso tirar ou por na mochila, obrigava a tal “engenharia” que me pareceu pouco viável no sentido prático do seu uso. Assim, ensaiei com o mesmo modelo, mas de 40 litros, e tudo passou a funcionar; Espaço suficiente para tudo dentro da mochila, a sua arrumação e utilização eram fáceis. Estava encontrada a combinação. Claro, um pouquinho mais pesada…mas mais prática! Material necessário e saco estavam decididos. Mochila -40 Litros – Peso total-6,240 Kg+500 gr água
A credencial do peregrino
Embora a motivação para uma caminhada até Santiago, seja normalmente conotada com motivações religiosas e questões de fé, no meu caso pessoal, e não querendo de forma alguma chocar aqueles que tenham dificuldade em compreender as minhas motivações, a motivação passou, basicamente, pela motivação de todas as caminhadas. Simples e claro. Sair de “A” e (tentar) chegar a “B”. Muito matemático – dirão alguns!. Muito laico, para um caminho carregado de Religiosidade, mitos e cultos que perduram no tempo – Dirão outros. Mas foi só isso! Ir a Santiago pelo Caminho Português. De Ponte de Lima a Santiago de Compostela.
“Googlando” Caminho de Santiago e Jacobeu – Xacobeu e Caminho Português e Caminhos de Santiago e Peregrinação e… mais o não sei quê…tudo vai dar a 3 ou 4 “sítios” onde a informação nem sempre é clara ou fiável. Mas é a que há. Para usar um Albergue de Peregrinos, é sempre necessário uma “Credencial de Peregrino”. Primeira grande conclusão!
Como a obter?
Decidi ir ao “Turismo”! em Viana do Castelo! Primeiro passo desta caminhada de 160km, números redondos, mais palmo, menos palmo!
Além de encontrar gente conhecida e amabilíssima, que me receberam com toda a deferência e com profissionalismo requintado, não deixei de sentir que, no meu modo muito pessoal de interpretar estas situações, algum constrangimento ao comentarmos, cordialmente, o “funcionamento” do Caminho Português.
A informação existe! mas chegar a ela, continua a ser “enredante”, digo, maçadora e, no mínimo, desmotivante.
Disponibilizaram-me informação em brochuras e até um guia com “tiragem” limitada, pelas quais reforço os meus agradecimentos, mas….mas, a “Credencial” não podia ser obtida ali! Estranho? Ponto final, parágrafo!
Mas, no entanto, coisa louvável, obtive todos os contactos e procedimentos para a sua obtenção!
Uma série de telefonemas, e parecia-me já estar a fazer o “Caminho”.
Não posso deixar de salientar a disponibilidade e amabilidade de todos os interlocutores dum périplo telefónico iniciado em Viana, até à minha deslocação a Esposende, para receber em mão a Credencial. Agradeço a cortesia do Sr. M. Miranda (núcleo de Esposende).
Associação Espaço Jacobeus – Praça da Faculdade de Filosofia, 16 – Apartado 3056 – 4711-906 Braga
www.jacobeus.web.pt
Nota: Depois de ter chegado, soube da existência de uma associação de amigos do Caminho em Viana do Castelo, entre outras.
A Partida
Depois de cumpridos detalhes de última hora que me fizeram adiar sucessivamente a partida, acabei por iniciar a viagem no dia 8 de Abril, desde o Largo Camões, em Ponte de Lima, às 13:45. Linda hora! mas foi o que se pode arranjar. Partir no dia seguinte, configurava problemas ainda maiores do que a improvisação que resultaria na gestão das etapas, que inicialmente previa uma saída cedo pela manhã, com o objectivo de chegar a Tui logo no 1º dia.
Assim, depois de tudo pensado, via-me forçado a começar “de improviso”. Primeiro grande momento de constatação da vantagem de ter decidido ir sozinho! Tudo se resolverá, e pés ao caminho!
As Etapas
Depois de ter começado quase 6 horas depois do previsto, estava fora de questão cumprir o programado e efectuar as etapas inicialmente escolhidas. A escolha assentava na distribuição equilibrada dos quilómetros a percorrer em cada dia, bem como a existência, ou não, de Albergues na zona. A intenção era não fazer jornadas muito pesadas nem muito ligeiras, ficando preferencialmente em Albergues. As etapas realizadas, adaptação forçada do itinerário inicial em consequência da partida muito atrasada, foram as seguintes:
1º Dia – Ponte de Lima – Rubiães – 19 Km
2º Dia – Rubiães – Porriño – 38 Km
3º Dia – Porriño – Arcade – 22 Km
4º Dia – Arcade – Caldas de Reis – 33.8 Km
5º Dia – Caldas de Reis – Picaraña – 29.2 Km
6º Dia – Picaraña – Santiago – 14.6 Km
Embora pudesse ter chegado a Santiago no 5º dia, optei por não sobrecarregar a jornada em demasia e chegar a Santiago pela manhã, mais fresco e com mais tempo, só no dia seguinte.
Opiniões pessoais
Como já disse anteriormente, a minha motivação para o Caminho, foi, entre outras, o gosto por caminhar e a experiência de uma caminhada longa por um caminho carregado de história. Também tiveram o seu peso as constantes sugestões, quer de outros caminheiros quer de peregrinos propriamente ditos, para fazer o Caminho. Todos me garantiam uma experiência inolvidável.
Não digo que estivessem enganados, ou tenham exagerado a sua apreciação do caminho. De facto, a experiência é de todo positiva. Mas, sendo rigoroso na apreciação pessoal do caminho, quase me atrevo a dizer que “soube a pouco!”
Explico, sem romancear muito.
Esperava um Caminho mais genuíno. Com menos asfalto e tramos comuns em estradas nacionais. Com menos betão e aldeias menos descaracterizadas. Ingenuidade minha, está-se mesmo a ver! Ao longo do tempo, o progresso e as vias de comunicação foram “desenvolvendo” o Caminho. O resultado não podia ser outro. Ao contrário de quem diz que o Caminho se alegra ao deixarmos montes e vales e nos aproximamos de centros urbanos, as minhas maiores “alegrias” foram sempre nos trechos mais isolados da civilização.
Restam pequenos trechos onde se respira ainda o que de mais autêntico chegou a nós de toda a história e imaginário deste itinerário. Felizmente que o seu peso na apreciação global supera, em número, a enorme quantidade de quilómetros em pavimento betuminoso, sendo o balanço final positivo.
Quanto à sinalização, os reparos são mínimos. Não tive qualquer problema de navegação. No entanto, alguns sinais estão colocados em sítios pouco apropriados ou chegam a pecar por excesso. Por vezes, parece haver demasiadas colaborações voluntárias, na sinalização do Caminho.
* * *
1ª Etapa – Ponte de Lima a Rubiães – 19 Km
Tendo (!) que assinalar na credencial o ponto de partida, e ficando o Albergue de Peregrinos de Ponte de Lima logo ali no final da ponte velha, optei por carimba-la aí. Parecia-me o local indicado e ideal para obter mais alguma informação sobre o “Caminho”.
De portas fechadas, o horário exibido indicava a abertura só às 17:00 horas. Inquestionável esperar!
Pouco preocupado com o formalismo do carimbo, mesmo assim, decidi entrar no café contiguo e solicitar assim o carimbo que iria marcar o local de início, ao qual pronta e amavelmente acederam.
Seguindo as setas amarelas, facilmente deixo Ponte de Lima em direcção a Arcozelo por entre muros e vinhas, pleno cenário rural minhoto, em terrenos bastante inundados onde as rãs coaxavam para logo apressadamente mergulharem nos charcos à minha passagem.
Mochila ajustada, pernas aquecidas, fresco e cheio de vontade, passo a Quinta de Sabadão e prossigo por terrenos agrícolas passando Arcozelo rumo à Labruja. Ao passar o lugar de Riba Rio, ainda em Arcozelo, não deixei de visitar o Riba Rio Café-bar do Sr. Benvindo Brito, que amavelmente nos recebe das 9 às 22:00. Local aprazível merecedor de uma visita, não só pela qualidade dos produtos, bem como do serviço apresentado.
Eram 16:00 horas quando cheguei ao lugar de Revolta, já na Labruja. Uma breve visita à “venda” do Sr. Manuel Brito, dois dedos de conversa, responder a algumas perguntas de resposta óbvia -“sim, vou para Santiago!”, mais um carimbo, prontamente sugerido pela proprietária, revelando familiaridade e apreço pelos Caminheiros e Peregrinos que ali vão passando. Depois da Revolta, só faltava subir a única subida digna do nome em todo o trajecto, passar a Cruz dos Franceses, o Quartel da Brigada, para depois descer por Agualonga, Lugar de Cabanas até Rubiães, já concelho de Paredes de Coura, onde cheguei pouco antes das 18:00H.
Chegado a Rubiães passando mesmo por trás da igreja românica, segui até ao Albergue a cargo da Junta de Freguesia, onde mais tarde tive o prazer de encontrar o seu responsável máximo, o sr. Francisco Dias, presidente da J.F. de Rubiães, que de modo muito simpático, explicou o funcionamento bem como as transformações que a antiga escola primária sofreu para hoje se ter convertido em Albergue.
Uma vez instalado, saí do Albergue descendo em direcção à ponte romana para logo a seguir passar na “venda”, onde providenciei o pequeno-almoço do dia seguinte. Regressado ao Albergue, tempo ainda para um café e conhecer e conviver breves momentos com os outros simpáticos ocupantes.
2ª Etapa – Rubiães a Porriño – 39 Km
Saida às 8:00. Seguindo pela ponte romana, tomei a direcção de S. Bento, esperando a luz do sol, fazendo algumas fotos e caminhando junto ao Rio Coura que corria vigoroso à luz do amanhecer de um dia de céu limpo e azul. Prometia ser um dia quente. Depois de uma paragem de descanso pelos lados de Cerdal, atravesso a estrada nacional 13 no cruzamento para Arão cerca do meio dia para chegar a Valença cerca das 13:00. Mais um descanso entre as últimas fotos da Fortaleza de Valença e atravessar a ponte ferro-rodoviária sobre o Rio Minho para chegar a Tui, já território Galego.
Perdendo uma hora no relógio (GMT+1), mesmo assim pensei ser muito cedo para terminar a jornada. Coloquei a mim mesmo a possibilidade de ir até Porriño. Decisão difícil, considerando que estava na hora de maior calor e o dia estava quente, que teria que atravessar e parte mais desmotivante de todo o Caminho, o famoso Polígono Industrial das Gándras. Mas, enquanto subia as ruas e ruelas do centro antigo, até chegar à Catedral e, logo por trás, conhecer o Albergue de Tui, decidi continuar. Breve conversa no Albergue, mais um carimbo e siga para Porriño. Descendo novamente, aproveitando a varanda natural que Tui é sobre o Rio Minho, apreciando os seus belos recantos e monumentos, vou deixando Tui para trás. Pouco depois deparo-me com o primeiro trecho de estrada. Estrada de alcatrão. Puro e duro. Quente!. Uma berma pintada a vermelho, cria alguma segurança, mas não deixa de ser um tramo “desolador”. Segue-se uma das mais belas (e emblemática) parte do Caminho – A Ponte das Febres – onde descansei. Às 17:30H passava a ponte de Orbelle. Ainda antes de entrar no mal fadado Polígono Industrial, passei no Suzo-Bar, estrategicamente posicionado, foi altura de tomar fôlego para atacar As Gándras. (Obrigado pelo telefonema Paulo). Logo a seguir entro em Porriño. Passagem pelo centro em direcção ao Albergue onde cheguei às 19.45. Este Albergue encerra às 22:00, não sendo possível entrar depois desta hora, mesmo registado anteriormente.
Continua…